Por Marcela Jansen, do Correio Online
Um edital federal, publicado no final de abril, acendeu o estopim de uma crise no campo no Acre. Produtores rurais passaram a ser notificados por embargos ambientais, baseados em imagens de satélite, sem vistorias in loco nem critérios transparentes. A medida, que mira áreas com supostas infrações ambientais em blocos georreferenciados, gerou indignação e sensação de abandono entre famílias que vivem da terra há décadas.
O descontentamento tomou forma na terça-feira, 27, em reunião com deputados estaduais na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac). O ponto de partida foi a fala do deputado Tanízio Sá (MDB), que denunciou o risco de colapso na economia rural em cidades como Sena Madureira. Segundo ele, só no Ramal do Cassirian, 40 mil cabeças de gado estão ameaçadas de remoção. “Estão querendo tomar as terras de quem passou a vida inteira trabalhando. Isso não é política ambiental, é agressão institucional”, afirmou.
Durante a sessão, relatos de produtores rurais trouxeram à tona o impacto humano por trás dos documentos oficiais. “Recebemos notificação por CPF, direto no Diário Oficial da União. Sem saber onde, nem por quê. A gente acordou do sonho de viver produzindo em paz”, disse Geraldo Pereira, pecuarista e liderança na região.
Valdir Teixeira, produtor de alimentos, chorou ao lembrar da trajetória da família. “Minha filha cresceu embaixo dos paus enquanto eu plantava. Sofremos muito para construir o que temos. Agora vem isso, do nada, sem explicação, só com multa e ameaça de desocupação”.

A crítica mais dura veio do líder do governo na Aleac, deputado Manoel Moraes (Progressistas), que classificou a legislação federal como “um monstro que chegou para engolir o Acre”. Ele defendeu que o estado não aceite “pontinhos no mapa decidindo a vida do povo” e que é preciso fortalecer o Programa de Regularização Ambiental (PRA) como alternativa.
A proposta mais concreta do dia veio do deputado Eduardo Ribeiro (PSD), que lembrou a existência da Lei estadual nº 4.507/2024, aprovada no fim do ano passado, permitindo a compensação ambiental com uso de florestas públicas do Acre. “Temos um dos maiores estoques de floresta pública do país. Por que não usá-los para garantir o direito de produzir dos pequenos e médios?”, questionou.
A regulamentação da medida será cobrada do secretário de Meio Ambiente, Leonardo das Neves Carvalho, em reunião a ser agendada nos próximos dias. Ao fim do encontro, Tanízio Sá reiterou a necessidade de uma articulação nacional. “Vamos propor um plano de anistia para os produtores já embargados. Isso é uma dívida do Brasil com o Acre. Não dá para continuar tratando nosso povo como infrator por decreto.”
Apesar da indignação generalizada, o tom da reunião foi de busca por soluções legais e políticas. A Assembleia Legislativa vai oficializar o pedido de audiência pública com o Ibama, Incra, Iteracre, Imac e Ministério Público, além de pressionar a bancada federal por mudanças legislativas urgentes.
Enquanto isso, no campo, o clima é de incerteza. Sem saber se continuar produzindo será considerado crime, milhares de famílias vivem entre a esperança de um acordo e o medo de perder tudo da noite para o dia.