Por Marcela Jansen, do Correio Online
Dados recentes do Banco Central revelam que, em 2024, 91,7 % dos créditos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) foram direcionados à pecuária convencional na Amazônia Legal. Desse montante restante, apenas 8,3 % beneficiaram atividades agrícolas, com predomínio de commodities como soja e milho .
Produtores de itens ligados à sociobioeconomia – como açaí, castanha, cacau nativo, óleos vegetais, fibras e pescado – sofreram ainda mais: 99 % nunca acessaram crédito rural. A Conexsus aponta que isso se deve, em grande parte, à exigência de documentos pessoais (CAF, CAR) incompatíveis com a realidade de comunidades extrativistas, quilombolas, ribeirinhas e indígenas .
Embora o Pronaf ofereça nove linhas de financiamento a juros baixos (0,5 % a 6 %) e valores de até R$ 420 mil por beneficiário, quase sua totalidade segue presa ao agronegócio da pecuária, ignorando cadeias produtivas que promovem conservação, geração de renda e serviços ecossistêmicos.

O caso do Acre
No Acre, estado marcado por comunidades extrativistas, produção de castanha e açaí, além de forte presença indígena, esse modelo concentrador aprofunda desigualdades. A burocracia documental afasta pequenos grupos da floresta, limitando acesso a linhas específicas como o Pronaf Bioeconomia e Agroecologia, pilares para o desenvolvimento socioambiental da região.
A ONG OsócioBio, em conjunto com a Conexsus, elaborou uma nota técnica destacando que, na Amazônia Legal, 91,7 % dos recursos do Pronaf são destinados à pecuária, enquanto menos de 1 % chega às cadeias sustentáveis. Entre as propostas para o Plano Safra 2025/26 estão: simplificação de exigências documentais para territórios coletivos; estabelecimento de metas obrigatórias (mínimo de 20 %) de recursos para cadeias da sociobioeconomia, com penalização para bancos que não cumprirem; apoio à emissão coletiva de CAF pelas próprias organizações comunitárias e desenvolvimento de soluções digitais offline para acesso remoto ao crédito.
Esse reposicionamento é visto como uma medida de fortalecimento econômico e preservação ambiental no Acre, combinando desenvolvimento sustentável, segurança alimentar e fomento da floresta como base produtiva.